Dia 28 de setembro é o Dia de Luta pela Legalização do Aborto na América Latina e Caribe. Qual a importância dessa data e como está colocada na realidade a questão do aborto hoje?
Nos manifestamos dentro das universidades e locais de trabalho em defesa de nosso direito à vida e de decidir sobre nossos próprios corpos cotidianamente. E isso deve ganhar maior força neste mês, quando se aproxima o dia 28 de setembro. Em toda a América Latina estima-se que morrem cerca de 5 mil mulheres todos os anos por conseqüência da clandestinidade do aborto. No Brasil cerca de 1 milhão de abortos são realizados por ano, são feitas 250.000 internações para o tratamento das complicações de aborto no sistema público de saúde, sendo que em estados como BA e PE a primeira causa de mortalidade materna é em conseqüência de abortos clandestinos. Qualquer profissional da saúde sabe que essas mortes são perfeitamente evitáveis, concordem ou não com a legalização do aborto. Mas porque então as mulheres seguem morrendo ensangüentadas, sofrendo conseqüências graves como infecções que as levam a ter que retirar o útero, passando por humilhações de todo o tipo nos hospitais, tendo seu útero perfurado, sendo deixadas 2, 3 dias sagrando nas macas como “punição”, entre tantas outras atrocidades?
E frente a tudo isso, os setores contrários ao direito ao aborto seguem na ofensiva...
Sim, é verdade. Sobre nossos corpos se impõe a Igreja aliada aos distintos governos, além da Frente Nacional Parlamentar Contra o Direito ao Aborto. Além disso, está sendo organizado para o ano que vem um “Encontro internacional pela vida” sediado no Brasil, que é tido como um exemplo no combate à legalização do aborto, por exemplo com o caso de quase 10 mil mulheres perseguidas pela justiça burguesa no Mato Grosso do Sul por terem fichas médicas numa clínica clandestina, e algumas cumprindo pena trabalhando em creches.
No meio da crise capitalista enquanto o governo Lula salva os capitalistas com bilhões de reais, mulheres e seus filhos morrem nas filas dos hospitais, diante de epidemias como a dengue, e recentemente a gripe A, e morrem todos os dias por conseqüências de abortos clandestinos. Enquanto isso, no mês passado foi dado dinheiro do governo para a realização de uma marcha em Brasília contra o direito ao aborto. Ao mesmo tempo, o posicionamento de figuras políticas contrárias ao direito ao aborto tem gerado intensas discussões, como se demonstrou no PSOL, quando em seu recente Congresso muitos militantes se rebelaram contra Heloísa Helena que faz campanha ativa contra esse direito, indo contra a própria resolução do partido sobre essa questão.
No caso do PT, estamos vendo nesta semana que Luiz Bassuma (BA) e Henrique Afonso (AC), ambos deputados federais, estão sendo punidos pelo partido por se colocar contra a descriminalização do aborto. Esses fatos novamente colocam com mais destaque o debate sobre o tema. Outro aspecto é que os partidos políticos já se preparam para as eleições de 2010 e há duas figuras femininas em destaque, que são Dilma Roussef e agora Marina Silva. Toda a aparência de progressista que Marina Silva tenta destacar em sua saída do PT esconde um fato que não é qualquer: assim como Heloísa Helena, ela se coloca contra um direito democrático elementar. Dilma se posiciona timidamente a favor da legalização, mas teríamos que perguntar como pôde cumprir um papel tão central no governo de Lula durante anos ao mesmo tempo em que sob esse governo não se avançou de fato na legislação que segue punindo brutalmente as mulheres que abortam. A verdade é que temos que aproveitar esse cenário em que muito se discutirá sobre o papel das mulheres e os discursos de emancipação. Temos que dizer em alto e bom som que enquanto meia dúzia de mulheres ascende ao poder, nós, mulheres trabalhadoras e pobres, seguimos morrendo nos corredores dos hospitais. E isso não pode significar emancipação.
Fale um pouco sobre a Campanha Latino Americana pelo Direito ao Aborto e as ações para o dia 28 de setembro.
A campanha está presente na Argentina, Bolívia, Brasil e Chile. Falando de América Latina, estamos num contexto em que a direita endurece suas ações, tendo em Honduras a sua principal expressão. Ao mesmo tempo, a resistência de massas se coloca e as mulheres estão cumprindo um papel destacado. Não tratamos do tema do aborto desligado dessas questões da realidade. Combater a ofensiva dos setores mais reacionários é parte fundamental da nossa luta. Nesse sentido, acho muito importante que somemos forças em frentes únicas amplas colocando-nos contra o golpe em Honduras e também na luta pelo direito ao aborto.
No Brasil, desde a Campanha Latino Americana, organizaremos atividades nas universidades e locais de trabalho, e também estaremos presentes nas ações pela legalização do aborto convocadas por outros movimentos e organizações, ao mesmo tempo em que mantemos públicas nossas diferenças políticas como é o caso da Frente Pela Legalização do Aborto, que tem um Manifesto que não assinamos por trazer em seu conteúdo uma defesa da democracia dos ricos que não compartilhamos. Mas penso que é fundamental somar forças em ações concretas. No CACH, Centro acadêmico de Ciências Humanas da Unicamp, onde atuamos, as/os companheiras/os votaram um chamado a organizar atividades no fim desse mês. Na reunião nacional da ANEL (Assembléia Nacional dos Estudantes Livre, impulsionada pelo PSTU) também propusemos impulsionar atividades pelo direito ao aborto, o que foi aprovado – e agora é hora de concretizar essa resolução. É preciso que as mulheres de toda a América Latina nos levantemos para dizer basta de mortes por abortos clandestinos, para que possamos decidir sobre nossos corpos e nossas vidas! Lutando por educação sexual em todos os níveis da educação pública, por contraceptivos gratuitos de qualidade e pelo direito ao aborto legal, livre, seguro e gratuito, garantido pelo Estado.
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