Esses versos de Brecht expressam a nossa visão sobre a polêmica que se estabeleceu no curso de Letras em relação ao ocorrido na noite de quinta-feira da semana passada. Em meio à apuração da votação para o Caell, um grupo de pessoas entoou um grito de “gostosa”. Se dirigiam a uma militante que estava na mesa da apuração. Queríamos então que os autores da atitude machista se retratassem. E o que ouvimos, já do lado de fora do prédio, foram mais provocações e frases machistas. Filmaram, se esconderam e se trancaram no espaço dos estudantes; exigimos que apagassem as imagens, lembrando de todas as vezes em que os antigreves(istas) na universidade se utilizaram de edições bem arquitetadas postadas no Youtube para criminalizar o movimento estudantil e de trabalhadores na USP nesse mesmo ano. Apagaram, e então abrimos um corredor para que fossem embora. Demoraram, mais enfim saíram ao som das mulheres que mostravam que não engoliriam mais as manifestações machistas de setores de direita no curso em relação a mulheres do movimento estudantil.
Isso tudo se deu em meio a um clima de provocações e polarização que os setores próximos à “chapa do Fusca” – que é uma chapa que em seu programa defende o sistema em que vivemos, sistema esse que oprime e explora a imensa maioria da humanidade, e ainda com mais intensidade as mulheres, negros e homossexuais – levaram adiante contra as chapas “Estado de Exceção”, que compúnhamos, “Uma Flor nasceu na rua”, “Para que Poetas” e “AJR”. O “gostosaaa!” foi mais uma forma desse setor tentar desmoralizar o movimento estudantil que tanto detestam.
A nossa resposta não foi só em relação ao “gostosa”, mas a todas as provocações daqueles que querem destruir o movimento estudantil da Letras, este mesmo que se une aos trabalhadores para lutar pela universidade pública. Eles se utilizaram da opressão secular que o sistema capitalista impõe às mulheres para desmoralizar-nos. Foi um exagero? Vejamos: na universidade não encontramos um mundo de igualdades, nem entre as pessoas de diferentes sexos, nem de diferentes cores, nem de diferentes extratos sociais; aqui acontece exatamente como lá fora. A estrutura da nossa universidade é uma das mais elitistas, machistas e racistas desse país. Nela, são poucos os negros que entram para estudar e muitos os que entram para limpar o chão e ganhar um salário de miséria, e boa parte destes são mulheres. Nela, vemos uma burocracia encastelada que exclui a comunidade universitária e a sociedade – que a sustenta – das suas decisões, e que coloca cada vez mais nossa produção para gerar lucro para alguns poucos da FIESP e cia. Nela, vemos o silêncio dessa mesma burocracia frente aos atos de violência sexual contra estudantes mulheres nas moradias, que saem impunes. Nela, vemos o silêncio e a condescendência em relação ao assédio moral e sexual a trabalhadoras (como pudemos ver no caso da gripe A em que as trabalhadoras grávidas, que eram grandes alvos, não foram dispensadas, sob ameaças de terem seus salários cortados). Nela, vemos a academia, com suas teses rebuscadas, reproduzindo e muitas vezes justificando o machismo, a opressão, a exploração. E nela é que vemos que os estudantes não são iguais: alguns se colocam em defesa DESTA universidade (explícita ou veladamente), e outros querem transformá-la.
Esta universidade de uma só classe, a dominante e exploradora, abre espaço para a reprodução de uma opressão machista também entre estudantes. E nesse caso, a divisão entre nós também a trouxe, e esta só poderia estar a favor da direita. É contra a atitude desses estudantes, que reiteram a opressão existente na universidade, que nos revoltamos. E é dessa forma que nós, movimento estudantil, precisamos lutar contra a opressão às mulheres e contra aqueles que querem afundar o movimento.
Agora, com Rodas nomeado reitor, não podemos deixar que esses setores cavem espaço entre os estudantes. Temos que dizer abertamente que os que propõem que o CA seja um mero distribuidor de riquezas “para mostrar que o capitalismo dá oportunidades a todos”, para tirar dos estudantes a sua ferramenta de luta, que são os CAs e DCE, estão do lado da reitoria que quer destruir o movimento estudantil e de trabalhadores. E sabemos que Rodas virá com pequenas concessões, por um lado, e com mão de ferro, por outro, para continuar a desenvolver aquele projeto de universidade. É como dissemos: “Fusca não anda sem Rodas!”. E na greve, onde estavam esses estudantes? Votaram contra a greve e em nenhum momento a construíram. E nas assembleias, aparecem? Se sim, somente na hora de votar contra greve e paralisação. Nos outros momentos não, pois não querem discutir dentro do movimento estudantil as suas posições ou fazer críticas para tornar o ME mais efetivo em sua luta.
Outra coisa que ninguém diz é que no meio do conflito e ao lado dos opressores estava o estudante da Letras que integra o CDIE, o mesmo grupo que chamou a polícia para reprimir o ME, que invadiu uma assembleia dos trabalhadores ameaçando Brandão e o Sintusp, que hoje levanta uma chapa para o DCE que institucionalize (por parte dos estudantes) a presença da PM no campus e que se diz abertamente antigreve. É esse tipo de estudante que Rodas quer: o que desarticule o ME e sua luta junto aos trabalhadores em prol de uma universidade democrática e pública.
Perante tudo isso, se coloca a necessidade de abrirmos um debate com a chapa eleita “Veredas”. Durante este ano diversos membros da gestão Olhos Livres e estudantes que compõem a nova gestão estiveram ao nosso lado para defender o Sintusp e combater os estudantes do flashmob (CDIE) que se organizaram contra a greve, dissolvendo o seu “ato”; estiveram ao nosso lado para lutar contra os professores fura-greves que intimidavam os alunos com provas e trabalhos; estiveram ao nosso lado para boicotar as eleições para reitor e impedir a entrada dos professores no CO. Quando os estudantes de direita, a mídia e a reitoria classificaram a luta dos trabalhadores e seus métodos legítimos de organização, como os piquetes e a greve, como violentos e intransigentes, a Olhos Livres/Veredas defendeu conosco o direito de lutarmos com intransigência em relação à direita e a burocracia acadêmica. Agora, em sua campanha, disseram que “o sertão aceita todos os nomes”. Foi um de seus apoiadores quem primeiro iniciou o coro machista. Em seguida, alguns integrantes da chapa se colocaram como protetores dos agressores, e agora cabe perguntar-lhes: são estes nomes os que aceitam?
Este é o primeiro momento em que a nova gestão terá de decidir que vereda irá trilhar: a das mulheres que se organizam contra a opressão – como uma luta que deve ser assimilada até o final pelo ME – ou a daqueles que as oprimem como uma “brincadeirinha”, com a intenção de desmoralizar o movimento. As divergências que temos dentro do ME devem ser debatidas politicamente, e não com os métodos da direita. Ou utilizam o mesmo argumento que os antigreves utilizaram contra a greve na USP, dizendo que somos truculentos e violentos ao nos organizarmos para lutar, ou se colocam claramente em defesa da luta contra a opressão, dizendo junto conosco que a organização e a luta dos oprimidos é justa e legítima, e injustos são os que oprimem e querem se safar como se nada houvesse acontecido; e com esses não há como abrir diálogo. Esperamos que os companheiros da Veredas revejam a atitude de alguns de seus integrantes e se coloquem, mais uma vez, ao nosso lado nesta luta.
Assim esperamos que se coloquem também os companheiros das chapas “Para que poetas?” e “AJR”, que se colocam como combativos e que agora tem mais uma chance concreta de mostrarem se estão dispostos a construir isto na prática, ou se sua combatividade serão palavras ao vento. Não estavam lá; mas esperamos que travem essa luta junto a nós.
Reivindicamos o ato que fizemos junto aos companheiros da chapa “Uma flor nasceu na rua!” como um exemplo, portanto, de luta contra o machismo e contra os estudantes de direita no curso. É preciso ver que medidas incisivas devem ser tomadas frente a violências contra as mulheres que se reproduzem na universidade, e que fora dela tomam proporções enormes. Não podemos nos esquecer que no Brasil mais de 90% dos casos de maridos que matam e LINCHAM suas mulheres saem impunes. Dizemos em alto e bom som: Queremos que a USP seja o exemplo de uma nova tradição no movimento estudantil nessa luta!
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