Por Marina Fuser*
Novos escândalos colocam o primeiro-ministro italiano de volta ao centro da cena midiática. Proprietário de uma das mais influentes emissoras televisivas do país, o milionário Silvio Berlusconi, primeiro-ministro da Itália, é pressionado a responder publicamente por sua conduta. Sua fama internacional já não ia muito bem quando cometeu a “indelicadeza” de se referir ao recém-eleito presidente estadounidense Barack Obama como “jovem, bonito e bronzeado”, num comentário abertamente racista do “Cavaliere”[1]. Mas a maior expressão de sua conduta anti-operária foi a ratificação do projeto de lei de segurança que considera a imigração irregular como um crime, tendo passado por 157 votos a favor, 124 contra e 3 abstenções, permitindo inclusive a prisão dos imigrantes por até 4 anos. E segue, da maneira que pode, disseminando a ideologia racista e opressora em diversos âmbitos de sua vida pública.
Machismo e insinuações: Berlusconi numa “saia-justa”
Um escândalo envolvendo prostitutas e muito dinheiro em suas festas privadas chocou o país, com a publicação de fotos e videos, bem como a confirmaçãoo de pelo menos quatro prostitutas, que alegam ter frequentado festas em seus palácios Grazioli e Villa Certosa. A opinião pública se encheu de moralismo, mas essa não foi a primeira expressão das relações opressivas de Berlusconi. Logo em sua primeira campanha, teve o mérito de sugerir a uma jovem trabalhadora precarizada que a melhor solução para melhorar sua qualidade de vida seria “encontrar um homem rico para casar, como o seu filho, por exemplo”[2].
Também, na cidade de L’Aquila, inconformado com a ausência de mulheres cientistas na assembléia da Farmindustria, o premiê vociferou o infeliz comentário: “Que fariam sem as mulheres? São homossexuais? Da próxima vez, trarei-lhes algumas showgirls: maiores de idade, claro”, disse. Cientistas das universidades de Milão, Perugia, Padua e Ferrara justificaram sua ausência como um protesto contra o discurso “inaceitavelmente sexista” do premiê. Cerca de 6.500 mulheres assinaram o chamado ao boicote que incita a ausência de primeira-damas à reuniao da cúpula prevista para julho em L’Aquila.
No início desse ano, uma carta da primeira-dama colocou Berlusconi numa “saia-justa”. O motivo úfoi seu comentário publico dirigido à deputada Maria Carfagna de que “se nao estivesse casado, casaria com ela imediatamente”. Essa foi apenas uma pérola entre outras tantas, mas na quarta-feira seguinte, eis que uma carta da primeira-dama Veronica Berlusconi perfilava na primeira página do jornal La Repubblica, condenando-o de ferir sua dignidade e exigindo um retratamento público por sua conduta inapropriada. A primeira-dama foi cercada de solidariedade pela opiniao pública em geral, por grupos feministas e inclusive por alguns membros da Igreja, como o Cardeal Ersilio Tonini.
Mas foi em abril de 2008 que ocorreu o caso mais emblemático, quando uma declaração de Berlusconi acerca da onda de estupro no país soou como um trovão na opinião pública: O registro de mais de 60 casos de violência sexual em Roma e na Sardenha no mês de março culmina em cerca de 30% a mais do que apontam os índices dos meses anteriores. A maneira “berlusconica” de responder a esse cenário suscitou algumas controvérsias frente à opinião pública: tropas nas ruas. Sobre isso, ele declarou: “Não poderiamos recrutar uma força grande o suficiente para evitar este risco (de estupros). Teriamos de ter tantos soldados nas ruas quanto mulheres bonitas. Não acho que conseguiriamos”.
Abaixo a opressão contra as mulheres disseminada no governo Berlusconi! Abaixo as leis racistas contra os imigrantes!
Na Itália, a opressão e a exploração de trabalhadores dá o tom de um governo abertamente anti-operário, munido de uma ideologia reacionária, machista e racista. A política anti-imigração de Berlusconi coloca em relevo o tratamento que dedica aos extratos mais pauperizados e oprimidos da sociedade, atingindo grande parte da classe trabalhadora. Suas gafes infelizes e a sua conduta abertamente machista são apenas demonstrações da ideologia que está por trás da sua política, que subordina a mulher ao poderio quase medieval do seu senhor. Seu conservadorismo se faz sentir quando Berlusconi fez questao de solicitar que a Declaração dos Direitos Humanos incluisse em sua pauta que “todo indivíduo tem direito a vida, da concepção à morte natural”, tornando evidente a sua intenção de fazer retroceder a legislação italiana, onde o aborto é legal – uma conquista do movimento feminista italiano entre as décadas de 1960 e 1970 que provocou uma diminuição significativa no número de abortos e pôs fim às clinicas clandestinas, segundo a consitucionalista italiana Lorenza Carlassare.
Os suscessivos escândalos envolvendo o primeiro-ministro, mas principalmente sua conduta abertamente anti-operária, tem como pano de fundo a crise internacional do capitalismo, e por isso suscitam respostas contundentes. A opinião pública negativa frente à politica reacionária do governo Berlusconi tem servido de estopim às mobilizaçoes que vêm se fermentando desde o último trimestre do ano passado. O despertar do movimento estudantil italiano em outubro não foi um ato isolado de rebeldia juvenil como gosta de pintar a mídia. Os 15 milhões de trabalhadores que atualmente situam-se abaixo do nível de pobreza tem retomado a tradição de lutas do movimento operário italiano, seguindo o exemplo dos trabalhadores da Alitalia, dos imigrantes e “italianos de segunda geracao”, secundaristas, universitarios e professores que estão na vanguarda da nova onda de manifestações que incendeia o cenário italiano. Os sucessivos escândalos envolvendo as mulheres têm repercutido negativamente, e aparentemente as feministas, até entao adormecidas em suas respectivas ONG’s e partidos amorfos geralmente ligados à patronal, começam a dar indícios de que estão se despertanto. O boicote do G8 foi uma primeira tentativa, ainda que pouco crítica e de carater burguês (ao passo que depositam ilusões nas instâncias representativas da alta cupula do capitalismo mundial). Por isso, está em voga a necessidade de uma articulação independente entre mulheres e homens trabalhadores, imigrantes, professores e estudantes em torno de uma plataforma comum de reivindicações, que coloque em xeque a política de Berlusconi, que elucida o hiato entre a exploraçao e a opressão daqueles que fazem e refazem a Itália todos os dias.
Pela revogação imediata da lei anti-imigrantes!
Não ao machismo e a opressão disseminados pelo governo Berlusconi!
Que a crise seja paga pelos capitalistas!
Marina Fuser é integrante do grupo de mulheres Pão e Rosas
[1] “Cavaliere” – apelido de Berlusconi., que significa “cavaleiro”, uma alusao aos cavaleiros guerreiros e proprietarios de terras do periodo medieval.
[2] Fonte: http://jornal.publico.clix.pt/ , p.15.
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