Por Rita Frau
Em 2 dias mais de 5 mil pessoas
assistiram o vídeo “As 5 contradições da Igreja e do Papa no Brasil”, produzido
pelo grupo de mulheres Pão e Rosas. Com este texto queremos debater com estas e
outras milhares de pessoas sobre a luta pelo direito ao aborto e por um Estado
laico, apresentando quais são as ideias do grupo de mulheres Pão e Rosas.
A
vinda do papa ao Brasil teve uma grande repercussão onde a mídia internacional
deu grande destaque todos os dias. Nosso intuito com este vídeo não foi
questionar a fé religiosa das mulheres e população, e sim, mostrar o que está
“por trás” deste grande evento financiado pelos governos municipal, estadual do
RJ e pelo governo federal. Ao mesmo tempo, que o papa Francisco[1], aparece mundialmente como
uma figura humilde, que construiu sua carreira eclesial “junto aos mais pobres”,
discursando por justiça social e reivindicando as mobilizações de junho e julho
tendo a juventude à frente, foi aliado da ditadura militar na Argentina, uma
das mais sangrentas da América Latina.
Não
podemos apagar seu passado com uma borracha diante de uma ditadura que matou 30
mil militantes de esquerda e roubou bebês desses militantes entregando nas mãos
das famílias de generais e de empresários vinculados à ditadura militar. Com um
pouco mais de 33 anos, o papa Francisco militou em uma organização de direita chamada
Guarda de Ferro (Guardia de Hierro) e teve relação estreita com generais da
ditadura, como Emilio Massera, responsável pela tortura e mortes de pelo menos
3 mil opositores do regime militar argentino. Além disso, após a ditadura o papa
Francisco se colocou contra a anulação das leis de impunidade defendendo a
reconciliação com os genocidas da ditadura.
Se
no seu discurso de retorno ao Vaticano disse que os homossexuais não devem ser
“julgados ou marginalizados”[2], na Argentina se colocou
contra a Lei de Matrimônio Igualitário dizendo que era “uma guerra de Deus”
contra “uma movimentação do diabo”, além de censurar toda a possibilidade de
educação sexual nas escolas e políticas de saúde reprodutiva. E no Brasil, sua
Igreja distribuiu mais de 70 mil cartilhas contra o casamento igualitário
LGBTTI, contra o direito a adoção de crianças por casais homoafetivos e contra
o direito ao aborto.
Esta
mesma Igreja que excomungou familiares e médicos que realizaram o aborto de uma
criança que havia sido estuprada em Recife, que faz campanha para que o governo
deixe de entregar pílulas do dia seguinte às mulheres estupradas no país, é a
que está envolvida em escândalos de pedofilia e vive sem trabalhar banhada de
ouro e prata. Enquanto foram gastos mais de R$ 118 milhões com a vinda do papa
em detrimento de dinheiro público para saúde e educação, o Vaticano tem sua
riqueza estimada em US$ 6 bilhões. A população continua sem os mínimos serviços
básicos com qualidade, como saúde, moradia, educação e transporte – como se viu
com a enorme luta da juventude pela revogação do aumento que teve amplo apoio popular.
É em aliança com
este papa e a Igreja católica e evangélica que Dilma vem rifando os direitos das
mulheres e homossexuais, e lava a cara do passado do papa Francisco, pois
apesar de ter sido torturada pela ditadura, se coloca contra a punição dos
torturadores em nosso país, que andam livremente em seus carrões e moram em
condomínios de alto luxo enquanto ex-militantes e familiares vivem as sequelas
das torturas e mortes. Desde as eleições presidenciais, onde Dilma se calou em
relação à defesa do direito ao aborto, por pressão da base aliada (com partidos
burgueses e conservadores), abre cada vez mais espaço para ataques e a
interferência das Igrejas no Estado. Apesar da constituição de 1988 garantir o
Estado laico, cada ano vemos este direito ser jogado no lixo por Dilma através
de suas alianças com os setores conservadores. O Acordo Brasil-Vaticano,
assinado por Lula (2006), que segue no governo Dilma, é um dos exemplos desta
relação íntima entre Estado Brasileiro e Santa Sé. Este acordo além de
estabelecer que a Igreja católica seja beneficiada de isenções de impostos para
construir seus templos em território brasileiro, estabelece que nas escolas
públicas sejam ministradas aulas de ensino religioso.
Marco Feliciano
como presidente da Comissão de Direitos Humanos com apoio de Dilma, à cada dia
tenta passar um novo ataque as mulheres e homossexuais. Este pastor racista,
machista e homofóbico é porta-voz dos setores reacionários que querem fazer
passar projetos como a “Cura Gay”, “Estatuto do Nascituro” e mais recentemente
a tentativa de setores da Igreja tentam passar um projeto que impede a “profilaxia
de gravidez” para as mulheres vítimas de estupros. Além desses ataques, a aliança
com a Igreja católica e evangélica legitima a discriminação às religiões de
origem africanas que são parte da história da população negra e classe
trabalhadora de nosso país que vive cotidianamente na pele o racismo e a
exploração. Por isso, para garantir que
possamos escolher qualquer religião ou ainda não ter nenhuma, é preciso
lutarmos pela separação da Igreja do Estado! Fora Papa e Vaticano! Fim do
Acordo-Brasil Vaticano que dá isenção fiscal para a Igreja Católica e
estabelece o ensino religioso na escolas!
Enquanto esses
setores reacionários ganham espaço, a realidade das mulheres, negros e
homossexuais é a de violência, miséria e mortes. No Brasil quase 1 milhão de mulheres
realizam abortos na clandestinidade, sendo que apenas as mulheres ricas ou que se
endividam financeiramente podem pagar por um aborto em uma clínica clandestina,
que chega a custar 3 mil reais para mais.
A maioria das mulheres, trabalhadoras, pobres e negras realizam de maneira
precária, tomando remédios ou métodos improvisados que chegam a levá-las a
morte. O aborto clandestino é uma verdadeira prática de tortura contra as
mulheres, e ao contrário do que dizem, não se trata de método anticonceptivo,
mas da possibilidade de decidir sobre seu próprio corpo – e não morrer! – numa sociedade
que só nos relega miséria e opressão. Como dizia o dirigente da Revolução Russa
Leon Trotsky, o aborto é um triste direito.
A criminalização
do aborto está relacionada à uma ideologia cristã que considera como papel fundamental da mulher apenas sua
capacidade biológica de reprodução. Esta ideologia dá base à opressão das
mulheres e está à serviço da aliança entre Estado, Igreja e patrões para manter
a divisão entre homens e mulheres e sustentar este sistema de opressão e
exploração onde mulheres, homossexuais, travestis, transexuais e negros são
super explorados e discriminados cotidianamente. Por isso atacam o direito da livre
escolha da sexualidade e o direito de decidir sobre o próprio corpo, tratando
como vida um embrião e não tratando da vida das mulheres que são estupradas,
violentadas e morrem todos os dias na clandestinidade do aborto.
Ao mesmo tempo que o Estado, governos, patrões em aliança com as Igrejas, impõem as mulheres o destino da maternidade,
não garantem este direito. As mulheres trabalhadoras, pobres, negras, são as
que ocupam os postos de trabalho mais precários e recebem salários de miséria,
são as que não têm acesso à um sistema de saúde público de qualidade e são
obrigadas e enfrentarem filas para serem atendidas e realizarem o pré-natal,
são demitidas para que os patrões não paguem os direitos da licença
maternidade, não têm acesso as creches públicas para seus filhos e a licença
maternidade de 1 ano ainda é um direito a ser arrancado em nosso país. São as
que perdem seus filhos todos os dias com a violência policial nas periferias e
favelas! Sem contar nos mal-tratos que recebem vítimas de estupros e são
obrigadas a carregar em seu corpo o fruto desta violência, e muitas são presas
e obrigadas a pagarem suas penas com serviços voluntários em creches, como uma
forma de se reconciliarem com a maternidade que “outros” decidiram por nós. Não aceitamos
mais a morte de milhares de mulheres por abortos clandestinos. Enquanto as
mulheres ricas podem pagar as caríssimas clínicas clandestinas, nós continuamos
sendo 200.000 mortas, todos os anos. Não aceitaremos que dedicam mais por nós,
o corpo e a mente são nossos! Educação
sexual laica para decidir, contraceptivos gratuitos para não engravidar,
direito ao aborto legal, seguro e gratuito para não morrer! Arquivamento do
Estatuto do Nascituro!
Para
nós do grupo de mulheres Pão e Rosas a luta pelos direitos das mulheres deve
ser de forma independente dos governos, patrões e das Igrejas pois só assim
conseguiremos arrancar nossos direitos. Respeitamos a fé dos trabalhadores e da
população, mas denunciamos fortemente a hipocrisia da Igreja, do Papa e do
Vaticano. Tirem suas mãos de nossos corpos e vidas! Sabemos que sozinhas é
muito difícil e por isso chamamos a todas a construirmos um forte movimento de
mulheres pelos nossos direitos e contra esta sociedade de opressão e exploração.
Não basta uma mulher no poder, sejamos milhares nas ruas!
Venha conhecer,
debater e construir o grupo de mulheres Pão e Rosas! Plenária do Pão e Rosas dia 10 de agosto! Em breve mais informações.
[1]
http://www.ft-ci.org/Quem-e-Francisco-I-A-cumplicidade-de-Bergoglio-com-a-ditadura-militar?lang=pt_br
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