Reproduzimos abaixo artigo publicado no Jornal Palavra Operária, da Liga Estratégia Revolucionária - Quarta Internacional. Por Fernanda Figueira, assistente social formada pela PUC-SP e Camila Radwanski, estudante de História da PUC-SP. Ambas integram o grupo de mulheres Pão e Rosas.
Há 40 anos da batalha de Stonewall, o Brasil, país conhecido por ter a polícia mais assassina do mundo e por estar em primeiro lugar na lista dos países com maior número de vítimas da violência homofóbica, é palco de uma ação violenta e perversa contra um jovem negro e homossexual. Marcelo Campos foi espancado até morrer, no último dia 14, por um grupo de extrema-direita. O assassinato ocorreu no mesmo dia da 13 Parada Gay, evento que poucas horas antes tinha sido atacado por uma bomba caseira, ferindo mais de 20 pessoas. A Associação da Parada Gay sempre conta com o policiamento em seus atos para garantir “segurança” aos manifestantes e, após o ocorrido, o governador José Serra declarou que iria aumentar o policiamento na região do Largo do Arouche, frequentado por homossexuais. Entretanto, a existência da polícia nos atos e nos bairros não foi capaz de evitar esse assassinato, assim como não foi capaz de evitar as dezenas de assassinatos de homossexuais que tiveram no ano passado em Carapicuíba, e as outras centenas de assassinatos que vem ocorrendo e sendo ocultados pela mídia. Falta de “eficiência”? Não. Aqueles que viveram a batalha de Stonewall já diziam: “A polícia é contra os gays”.
A polícia é contra os homossexuais porque se nutre dos distintos tipos de opressões que persistem no capitalismo para seguir humilhando jovens negros nas favelas do país inteiro, para seguir perseguindo a mando da justiça burguesa as mulheres que são obrigadas a recorrer a abortos clandestinos e para seguir assassinando ou sendo coniventes com a morte de homossexuais. Ao mesmo tempo, essa mesma polícia é acionada para reprimir as lutas da classe trabalhadora, como vimos no episódio do dia 9 de junho, quando a Reitora Suely Vilela e o governador José Serra lançaram mão da polícia para reprimir os lutadores e lutadoras da greve da USP.
Essa violência homofóbica por parte da polícia se explica porque este aparato repressor do Estado está a serviço de manter os interesses da classe dominante. A homossexualidade é uma “afronta” à normalidade que estabelece que a sexualidade deve estar vinculada à reprodução, mantendo intactas as bases sociais da própria sociedade de classes através da unidade familiar. Conta-se, além disso, com o apoio da Igreja Católica, principal instituição disseminadora dessa ideologia. Eles dizem que “Segundo a ordem moral objetiva, as relações homossexuais são grave depravação e intrinsecamente desordenadas, não podendo em caso algum receber qualquer aprovação”. Toda essa ideologia contribui para o surgimento de grupos de extrema-direita, que mostram sua pior face ao espancar um jovem negro até a morte, como no caso de Marcelo Campos, mas também de forma mais dissimulada atacando as organizações operárias em luta, como através das ameaças de invasão do Sindicato dos Trabalhadores da USP, em greve há 52 dias.
A própria Associação da Parada Gay, que pouco representa a luta dos setores mais explorados que sofrem com a violência homofóbica, teve que se manifestar diante de tamanha atrocidade. Hoje, diante da truculência policial e dos atos fascistas de grupos de extrema-direita e também diante do descaso dos governos que seguem calados com essa brutal repressão, é preciso lutar pela independência política da luta dos homossexuais, nos unindo às lutas da classe trabalhadora, demonstrando que a nossa luta contra a homofobia e a opressão é parte de uma luta contra essa sociedade capitalista, e por isso queremos arrancar todos os nossos direitos de igualdade, com a clareza de que a verdadeira igualdade não será conquistada sob esse sistema.
Um debate necessário com a Conlutas
Apesar do trotskismo ter deixado o legado de que a polícia não é parte da classe trabalhadora, mas sim um instrumento de repressão da burguesia, a esquerda brasileira, moldada pelo petismo, ignora os ensinamentos desta tradição. Persiste entre praticamente toda a esquerda brasileira a defesa dos policiais enquanto “trabalhadores da segurança pública” incentivando os trabalhadores a apoiarem suas greves e considerá-los irmãos de classe. É de espantar, inclusive,
que a própria Conlutas e o PSTU, que ano passado tiveram seus militantes espancados por policiais a mando da direção da Parada Gay, sobre o assassinato de Marcelo Campos declarem que “A administração pública tem obrigação de tomar ‘todas as medidas para assegurar a proteção da população’ e isso não foi feito, uma vez que não havia policiamento no local no dia da agressão”. Vergonhoso. Enquanto a polícia aprofunda suas ações violentas contra os negros e negras nas favelas, reprime as lutas da classe trabalhadora e é conivente com o assassinato de um homossexual, a Conlutas considera que deveria haver mais policiamento no local do assassinato. Pior ainda, seguem defendendo que sindicatos de policiais façam parte da Conlutas.
Pouco ou nada aprenderam com o exemplo da batalha de Stonewall, que demonstrou que os policiais não são nossos irmãos de classe. Essa falsa idéia dissemina o pacifismo entre nossas fileiras, impedindo que a juventude negra, as mulheres, os homossexuais e os trabalhadores, quando reprimidos, se levantem na ofensiva contra a polícia repressora. É preciso avançar na luta pelos nossos direitos, retomando as bandeiras de Stonewall para organizar uma ampla campanha exigindo a punição de todos os assassinos de Marcelo Campos, na luta pela dissolução da polícia que nos oprime a mando de nossos exploradores!
Abaixo a violência policial contra a juventude negra e homossexual! Abaixo a homofobia! Pelo direito ao livre exercício de nossa sexualidade. Basta de discriminação e violência contra gays, lésbicas, travestis e transexuais! Não ao assédio moral nos locais de trabalho! Igual trabalho igual salário! Punição aos assassinos de Marcelo Campos!
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