quarta-feira, 17 de março de 2010

Ibiúna, 1968: "Com muito orgulho e emoção revi minhas companheiras de luta! Muitas já se foram mas muitas continuam aguerridas na batalha..."

Publicamos abaixo o depoimento de Bia Abramides, professora de Serviço Social na PUC-SP, e presidente da APROPUC, sobre a repressão e cerceamento político na ditadura militar, quando era estudante de Serviço Social nesta mesma Universidade onde hoje é professora. Seu relato foi enviado juntamente a um arquivo com as fotos das estudantes presas. Para ter acesso ao arquivo completo escreva para paoerosasbr@gmail.com.
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Na recuperação histórica das lutadoras, do direito à memória vão as fotos das estudantes presas em Ibiúna em 1968. Estou na fileira de número 47. Todas jovenzinhas. .. Com muito orgulho e emoção revi minhas companheiras de luta! Muitas já se foram mas muitas continuam aguerridas na batalha por uma sociedade emancipada.
Em outubro de 1968 ocorreu o XX Congresso da UNE (na ilegalidade) em Ibiúna, em um sítio. Éramos cerca de 1000 estudantes de todo o Brasil (entre rapazes e moças; as moças são as que aparecem nas fotos que enviei). A polícia chegou com camburão e fomos tod@s pres@s. O Congresso não se realizou. Na noite anterior foi a mesa de abertura e mal raiou o dia a repressão chegou. Primeiramente separaram homens de mulheres e fomos levad@s tod@s para o presídio Tiradentes(onde ficamos os primeiros dias) depois de andarmos uns 10 kilômetros escoltados até chegar no camburão. A seguir transferid@s para o Carandiru @s estudantes de São Paulo) e @s de outros estados foram transferidos para os presídios de seus estados. Nas celas éramos cerca de quarenta mulheres, que dormíamos em valete, bem espremidas. O banho era frio e a comida servida em latas de cera, e fria. Ficamos incomunicáveis. A Madre Cristina (do Sedes Sapientia) criou um comitê em defesa d@s presos polític@s de Ibiúna com @s pais e professores. Apesar de não haver tortura física, sofremos humilhações e tortura psicológica. Nos chamavam de prostitutas por termos nas bolsas pílulas anticoncepcionais e uma a uma fomos levadas para o Deops para prestar depoimento. Cada uma, em uma sala, isoladas, a noite toda ouvindo berros!!! Nos ameaçavam dizendo para tomar cuidado senão seríamos nós. Nos depoimentos nos identificamos como representantes d@s estudantes de nossas faculdades (e éramos), havíamos sido eleito@s nas assembleias de curso. Eu era aluna da PUCSP, do Serviço Social. No Tiradentes nos deixavam tomar um pouco de sol. Neste momento conversávamos com as presas comuns que nos contavam o seu sofrimento e humilhações. Depois que saímos fomos enquadrad@s na Lei de Segurança Nacional, prestando depoimentos periódicos, sem poder sair do pais e sem conseguir trabalhar, pelas delações. Quando conseguíamos um trabalho, mal sabiam que havíamos sido presas éramos demitidas. Comigo aconteceu no Hospital das Clínicas. Posso lhe dizer que o ano de 68 foi o mais importante para a minha convicção política e ideológica e da necessidade da revolução proletária para a conquista da emancipação humana.

Um grande beijo da Bia.

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