sábado, 18 de outubro de 2014

O Estado criminaliza as mulheres

Tatiana Cozarelli, Pão e Rosas Rio de Janeiro

No dia 28/09, dia latino americano e caribenho pela legalização do aborto, uma bancária de São Gonçalo, no estado do Rio de Janeiro, decidiu interromper sua gravidez, assim como as estimadas 2330 outras mulheres brasileiras que diariamente recorrem a esse procedimento. Ela ingeriu uma alta dose de medicamento abortivo e durante intensa hemorragia expeliu o feto no banheiro de sua tia que chamou a ambulância para socorrê-la. Ao invés de ir direto ao hospital, foi levada à delegacia após revelar a médica que havia tomado o medicamento. Para ser libertada e então levada a um hospital, a mulher teve de pagar 250 reais de fiança, respondendo ao processo que está tramitando pela Divisão de Homicídios da Polícia Civil.


Este é o terceiro caso de aborto nos últimos dois meses a ganhar atenção pública no Rio de Janeiro. Muito já foi escrito e dito sobre os terríveis casos de Jandira e da Elisângela, mulheres trabalhadoras do Rio de Janeiro que morreram na tentativa de realizar abortos em clínicas clandestinas mantidas por máfias que envolvem médicos e policiais. Estes três casos, somados aos milhares que acontecem ano após ano, nos demonstram não só a necessidade do direito ao aborto legal, seguro e gratuito, mas também a necessidade de que o Estado que crie condições materiais pra que mulheres possam ter o direito à maternidade e exercê-la plenamente.

O Estado é criminoso e as mulheres são as vítimas! 

O caso da mulher de São Gonçalo é diferente do caso de Jandira e da Elisangela porque ao sobreviver o Estado a trata como criminosa. No Brasil, provocar aborto em si mesmo ou permitir que outros o realizem é crime previsto pelo Código Penal com pena de detenção de um a três anos. É um absurdo que a mulher ao decidir sobre o que fazer sobre o seu corpo e a sua vida, seja penalizada. 



O Estado mata diariamente com a sua falta de investimento na saúde. Se esta mulher grávida morre na fila do SUS, o Estado fica impune. Esta grande hipocrisia do Estado que não se responsabiliza por um sistema de saúde de qualidade para a população causando até a morte, mas se intromete na autonomia do corpo da mulher e é responsável pela morte de mulheres que recorrem aos abortos clandestinos.

Além disso o Estado joga nas costas dos trabalhadores a responsabilidade por pagar os serviços básicos fundamentais que deveriam ser oferecidos gratuitamente com qualidade pelo próprio Estado, fazendo por exemplo, com que os trabalhadores paguem por planos de saúde. Ao mesmo tempo que o Estado direciona o dinheiro público para beneficiar os grandes empresários, como vimos na construção dos estádios para Copa em detrimento de melhorar a educação, o transporte público e a moradia da população. Neste caso, ainda mais absurdo, a mulher foi obrigada a pagar 250 reais de fiança, correndo risco de morrer a caminho do hospital, pelo fato do governo insistir na criminalização do aborto e ao mesmo tempo não fornecer condições adequadas para uma mulher trabalhadora exercer a maternidade.


No fim das contas as medidas de criminalizar e proibir o aborto são eficientes apenas para matar e punir mulheres pobres e trabalhadoras. Os números mostram que as mulheres continuam a interrompendo a gravidez e as consequências são a morte, sequelas, prisão e humilhação.

Um tema onipresente, exceto para os políticos que governam para a burguesia



No último mês até mesmo grandes jornais vem trazendo editoriais escancarando a necessidade de tratar a questão do aborto como uma questão de saúde pública e evidenciando que mesmo sendo ilegal milhares de mulheres realizam e muitas perdem suas vidas, principalmente pelo impacto causado pelas mortes de Jandira e Elisângela.
Dilma nesses quatro anos governou em aliança com os setores mais reacionários das bancadas religiosas, e mais uma vez mostra que seguirá com esta aliança e o silêncio diante de mulheres mortas mantendo a legislação atual que permite o aborto nos casos apenas de risco de morte para a mulher, fruto de violência sexual e fetos anencéfalos. Agora no segundo turno a realidade de milhares de mulheres passa longe dos discursos de Dilma e Aécio na corrida eleitoral. Qualquer um dos dois que vencer a campanha não mudará uma vírgula nesta realidade que é a quinta causa de morte entre as mulheres e causa tanta dor para tantas mulheres e amigos e familiares que perdem suas mães, amigas, filhas.


Os candidatos da esquerda que apoiaram abertamente a causa, como Luciana Genro (PSOL) e Zé Maria (PSTU), apesar de terem tocado no tema em suas falas públicas, não mobilizaram suas bases partidárias com força para compor os atos que aconteceram nacionalmente dia Latino Americano e Caribenho pela Legalização do Aborto. É fundamental que PSOL e PSTU que falaram em defesa deste direito tranforme o discurso em um movimento real de trabalhadores e juventude em torno das demandas democráticas para impulsionar a partir dos locais de trabalho e estudo uma campanha pelo direito ao aborto legal, seguro e gratuito. 

Basta de mulheres criminalizadas e mortas por abortos!

Educação sexual nas escolas para decidir, anticoncepcionais gratuitos e de qualidade para não abortar, direito ao aborto legal seguro e gratuito para não morrer!



Pelo direito ao aborto legal, seguro, gratuito e garantido pelo SUS! Por um SUS 100% público, controlado pelos trabalhadores e usuários!

Pelo direito à maternidade! Por creches, restaurantes e lavanderias públicos!

Pelo fim do acordo Brasil-Vaticano! Por um estado laico de fato!  

Nenhum comentário: