quinta-feira, 11 de abril de 2013

Mulheres, sejamos milhares na luta pelos nossos direitos!

 Por Iaci Maria, militante do grupo de mulheres Pão e Rosas - BH

No quinto ano da crise econômica que atingiu potências como os EUA e tem hoje seu epicentro na Europa, ao mesmo tempo em que se desenvolvem processos revolucionários como no Egito e se renovam os ventos da chamada primavera árabe como na Tunísia - ventos esses que por um tempo ficaram carregados de apoio da OTAN contra a ação independente das massas -, levanta-se a questão sobre a importância de tratar sobre a opressão às mulheres. Frente à atual situação política, econômica e social do mundo, por que tal tema deve vir à tona?

Ao redor do mundo, temos visto convulsões sociais e mobilizações de trabalhadores, estudantes, setores oprimidos da sociedade, indignados com a crise e com seus governos. Em muitas dessas mobilizações vimos amplos setores de mulheres saírem às ruas, tomando a frente dos processos de lutas e levantando suas bandeiras, como no Egito e na Índia. No Chile, as jovens levantaram pela educação pública, contra a repressão e contra a violência sexual dos agentes do regime herdeiro de Pinochet. Esses movimentos, que necessitam da auto-organização dos trabalhadores e dos estudantes e de direções revolucionárias para seguir avançando até sua vitória, precisam que essas direções guiem também na luta pelas demandas das mulheres, pelo fim das opressões. Para isso, é necessário entender o que significa a opressão da mulher no capitalismo.
  
EXPLORAÇÃO E OPRESSÃO NA SOCIEDADE DE CLASSES

Durante toda nossa formação, educação e construção social, as mulheres estão sujeitas a vários tipos de opressão. Desde a infância, com a divisão sexual entre cores e brinquedos, até o assédio nas casas, ruas, escola e trabalho, violências físicas e psicológicas, a obrigação de ser mãe, esposa e a mulher da tradicional família mineira ou a dona de casa, o salário menor do que o do homem, entre outras expressões da opressão. Várias dessas nos passam despercebidas ao longo da vida, sendo naturalizadas e aceitas sem questionamentos, inclusive sendo reproduzidas muitas vezes pelas próprias mulheres. 

Tudo isso porque vivemos hoje imersos em uma sociedade que tem suas bases consolidadas na exploração e opressão, pois o capitalismo se utiliza dos dois para seguir com seus lucros e sua dominação. Desde uma perspectiva marxista, a exploração tem suas raízes no aspecto estrutural econômico, sendo essa a relação da classe dominante – a burguesia, que se apropria do trabalho alheio – com a classe trabalhadora – a que produz.  Marx e Engels explicam essa relação de exploração entre a burguesia e o proletariado brevemente no Manifesto do Partido Comunista quando coloca:

“Com o desenvolvimento da burguesia, isto é, do capital, desenvolve-se também o proletariado, a classe dos operários modernos, os quais só vivem enquanto têm trabalho e só têm trabalho enquanto seu trabalho aumenta o capital. Esses operários, constrangidos a vender-se a retalho, são mercadoria, artigo de comércio como qualquer outro (...)” (Marx, Engels, 1848). [1].

Já a opressão é a relação de submissão de um grupo sobre outro por razões culturais, raciais, étnicas, sexuais ou de gênero, e faz uso da desigualdade. Porém, exploração e opressão se combinam de maneira perfeitamente orquestrada pelo capitalismo, para que sua burguesia consiga seguir em seu posto de classe dominante. Incentivando a divisão entre os trabalhadores, a burguesia sempre buscou as vias para aumentar a mais valia absoluta e relativa e uma de suas armas é a divisão entre homens e mulheres, disseminando a ideologia da submissão das mulheres. Quanto mais explorado é um setor, maior a expressão da sua opressão. Ou seja, mulheres pobres, trabalhadoras precárias, moradoras das favelas e periferias, em sua maioria negras, são as maiores vítimas das opressões. A opressão das mulheres se insere na história da luta de classe e, apesar de não ter surgido no capitalismo, ganha nesse sistema traços particulares, sendo apropriada pelo próprio sistema para a manutenção do status quo. Ainda no Manifesto, os autores mostram o papel que a mulher cumpre para a burguesia:

“‘Vós, comunistas, quereis introduzir a comunidade das mulheres!’, grita-nos toda a burguesia em coro. Para o burguês, a mulher nada mais é do que um instrumentos de produção. Ouvindo dizer que os instrumentos de produção serão explorados em comum, conclui naturalmente que o destino de propriedade coletiva caberá igualmente às mulheres. Não imagina que se trata precisamente de arrancar a mulher de seu papel de simples instrumento de produção.” (Marx, Engels, 1848) [2]

Contudo, há ainda hoje setores que dizem que as mulheres alcançaram a igualdade com os homens, podendo trabalhar fora, ocupam postos de chefia, são a maioria dentre os que possuem ensino superior completo, e até mesmo chegam a ser presidente. Entretanto, são ainda as mulheres as responsáveis pelos cuidados com a casa, comida, marido e filhos, gerando assim, às mulheres trabalhadoras, a dupla jornada de trabalho; além de ocuparem os postos de trabalho mais precários, estarem mais sujeitas às violências físicas e psicológicas – inclusive institucional em alguns países – e serem as milhares a morrerem em vários países devido à abortos clandestinos, senda essa no Brasil a quarta causa de morte entre mulheres, com aproximadamente 1 milhão de abortos realizados por ano.

Isso mostra como, desde o surgimento da sociedade dividida em classes, a posição de classe ocupada por uma pessoa expressa não só o nível de exploração ao qual ela está submetida como, diretamente ligada a esse, expressa quais os limites da opressão sofrida, estando a mulher trabalhadora submetida à dupla jornada de trabalho desde o início do capitalismo. Por exemplo, uma mulher em dado emprego possui um salário que corresponde a cerca de 66% do salário de um homem que ocupa a mesma posição. Porém, quanto mais precário for o trabalho, mais serão as mulheres quem ocuparão esses postos, tendo ainda necessariamente que, além de trabalhar exaustivamente por salários de miséria, responder pela manutenção da casa e da vida do marido e filhos por não ter condições financeiras de arcar com empregadas domésticas, babás, creches privadas – empregos estes que são também a expressão de como são as mulheres as relegadas aos trabalhos mais precários, ligados à limpeza e cuidados.

Esse trabalho não remunerado que a mulher exerce na casa e na criação e educação dos filhos é a garantia de que o marido – o trabalhador assalariado e explorado – esteja sempre em condições de seguir com seu trabalho, estando alimentado, com as roupas limpas, a casa arrumada. E isso sem que o Estado precise se preocupar com a garantia de nada disso – garantindo creches, lavanderias, e restaurantes públicos – ou seja, é nesse trabalho doméstico não remunerado que está parte do lucro dos capitalistas. O capitalismo se apropria da opressão histórica da mulher para fortalecer a exploração, ampliar seus lucros, além de dividir a classe trabalhadora. E é por isso que a posição de classe faz diferença na opressão, pois são as mulheres pobres e negras as mais afetadas pela segunda jornada não remunerada de trabalho.


A PRECARIZAÇÃO TEM ROSTO DE MULHER!

A precarização do trabalho é mais uma grande expressão da precarização da vida da mulher, sendo cada vez mais frequente e, nos últimos 10 anos no Brasil, cresceu ofensivamente durante os governos Lula e agora Dilma. A atual presidenta mostrou também que ser mulher não significa avanços minimamente democráticos para as mulheres, pois ainda em seu período eleitoral, Dilma rifou os direitos das mulheres em sua campanha em troca de votos. Em sua “carta ao povo de Deus”, ela garantiu aos setores religiosos que não legalizaria do aborto, bandeira essa histórica dos movimentos de mulheres, que a então candidata suprimiu de seu programa. Assim, a atual presidenta ganhou o apoio dos setores mais conservadores e da bancada evangélica do Congresso, aqueles que mais atacam as mulheres e seus direitos. Já o trabalho precário vem crescendo desde o governo Lula, que sob o discurso de fim do desemprego e criação de novos postos de trabalho, fez aumentar o número de emprego precário, terceirizado, e aumentou também a rotatividade do trabalho. 

Basta olharmos ao nosso redor que veremos trabalhadores “invisíveis” trabalhando por salários de miséria, na limpeza, em condições insalubres, sem segurança e sem direitos. Se notarmos bem, a maioria dos que ocupam esses postos são mulheres, em sua maioria negras, as mais precarizadas no trabalho, e na vida. São também as que estão mais sujeitas a sofrer assédio e violência, muitas vezes do próprio companheiro, sem ter condições materiais e econômicas de se desfazer da relação e seguir sozinha, se mantendo e criando seus filhos.

Dentro da Universidade o quadro não é diferente, pois há também a reprodução da opressão entre os próprios estudantes. Exemplos disso são os trotes aos ingressantes; a imposição de um padrão de beleza que, se não seguido, gera humilhações e até violência física; a visão de que o corpo feminino enquanto uma mercadoria, pronta a servir aos interesses de quem quer que seja, o que gera assédios e até mesmo estupros; além dos casos de homofobia, onde os LGBTTI’s são também oprimidos, não podendo se expressar livremente, opressão essa que tem raízes também no machismo.

Além disso, hoje as Universidades públicas também se constroem com base na precarização. Grande parte do trabalho estruturante da Universidade é precário, terceirizado e realizado em sua maioria por mulheres. As trabalhadoras da limpeza, as cozinheiras do restaurante universitário, são aquelas que mantêm a Universidade funcionando, mas também são as que recebem os piores salários, sem garantias e direitos, e estando sujeitas a inúmeros acidentes de trabalho. Travar uma batalha contra qualquer tipo de opressão dentro e fora da Universidade deve passar necessariamente por defender esses trabalhadores precários, essas mulheres sujeitas à exploração e opressão diárias, pois é essa exploração e opressão combinadas que garantem os lucros e a manutenção do capitalismo e da burguesia enquanto classe dominante. Por isso o fim  da opressão jamais se dará por dentro do capitalismo, pois esse sistema não permitirá que se acabe com uma de suas bases de sustentação. 

Essa combinação arquitetada de exploração e opressão é a expressão da necessidade de se combinar também a luta das mulheres, estudantes e trabalhadoras, pelos seus direitos e pelo fim da opressão e violência, com a luta da classe trabalhadora pelo fim de sua exploração, da dupla jornada de trabalho e da precarização. Porque as mulheres são diretamente afetadas por esses ataques e, ainda que por dentro do capitalismo vimos alguns avanços, é preciso ter em mente que a opressão não cairá pelas mãos daqueles que dela tanto necessitam.
  
QUANDO UMA MULHER AVANÇA, NENHUM HOMEM RETROCEDE!

Somos todas oprimidas! Mas não somos iguais. Angela Merkel na Alemanha dirige os planos de reajuste na Europa contra os trabalhadores e o povo, sendo uma das principais responsáveis pelo desemprego, demissões e fechamento de fábricas nesses países. Dilma mantém o nível de precarização do trabalho como um dos pilares do antigo crescimento econômico, sendo grande parte destes postos ocupados por mulheres; Heloísa Straling, quando vice-Reitora, permitiu a entrada da tropa de choque e cavalaria na UFMG para reprimir estudantes em 2007. Isso mostra como a luta contra a opressão não está por fora da luta de classes. Há as chefes e burocratas acadêmicas, em grande parte brancas, que são parte dos planos para que sejam os trabalhadores e o povo a pagar por sua crise. E neste feito as mulheres trabalhadoras e pobres são as que mais sofrem. Na luta contra a opressão a classe trabalhadora é a única que pode se colocar à frente da conquista de todas as demandas democráticas do conjunto das mulheres! Entre todas as mulheres as que mais sentem as amarras capitalistas que nos prendem devem ter espaço para tomar à frente de nossa luta: as mulheres trabalhadoras que sofrem com a opressão e exploração e que devem ser acompanhadas pelas mulheres mais oprimidas do povo negro e pobre.

E é por isso que nós, do Grupo de Mulheres Pão e Rosas, reivindicamos que a juventude, como vem se mostrando ao redor do mundo, tem que cumprir o papel essencial de estar à frente dessas batalhas, contra a exploração e todas as formas de opressão. Um Movimento Estudantil combativo, enquanto um movimento de jovens dispostos a lutar e transformar não só a Universidade, mas a sociedade como um todo, deve estar ao lado da única classe capaz de levar a frente essa transformação da sociedade. Para isso as mulheres devem estar a frente desse movimento, levantando suas bandeiras, contra todas as formas de opressão, mas também contra a exploração que, quanto mais aguçada, mais humilha e oprime as mulheres. Cabe às estudantes lutar ao lado das demandas das trabalhadoras, escolhendo seu lado de classe; e às trabalhadoras se auto-organizarem para poder arrancar o fim de sua opressão, e o que lhes é seu por direito. Cabe à classe trabalhadora, organizada independente dos patrões, tomar para si as demandas das mulheres e dos setores oprimidos, travando uma luta unificada pelo fim da exploração e opressão.

- Pelo direito ao aborto livre, legal, seguro e garantido pelo estado!
- Não à precarização do trabalho e da vida! Igual trabalho, igual salário!
- Pelo fim da terceirização e incorporação imediata nas empresas e sem necessidade de concurso público nas instituições públicas!
- Pela aliança operário-estudantil
- Contra todas as formas de opressão!
Que os capitalistas paguem pela crise!


[1] MARX, K., ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista, 1848
[2] Idem

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