Reproduzimos abaixo a Contribuição LGBTTI escrita por Virginia Guitzel e Gustavo Melo para o Encontro de
Trabalhador@s, Estudantes, Mulheres, Negr@s e LGTTBI
A situação dos LGBTTI no Brasil e no mundo
O Brasil é
considerado o país mais homofóbico do mundo, superando os 78 países que possuem
essa opressão institucionalizada. Ainda neste triste cenário, a
lesbianidade/transexualidade/homossexualidade são consideradas como um crime,
que em pelo menos cinco países se aplica a pena de morte. Mesmo com todas as
mentiras do governo de Lula e Dilma, que se diz um governo dxs trabalhadorxs e
que defende os setores oprimidos, a homofobia cresceu 117% nos últimos sete
anos. A ideia de “um governo para todos” se contradiz com a realidade que se
tem de escolher entre Feliciano e os direitos básicos da população LGBTTI, como
fizeram xs dirigentes do PT em nome de uma pretensa governabilidade, em 2012. E
assim como o direito das mulheres - como a autodeterminação de seus corpos e a
legalização e gratuidade do aborto para não morrer desamparadas; nossos
direitos foram trocados por votos e alianças eleitorais. O Brasil do pleno
emprego segue com os LGBTTI nos postos de trabalho mais precários em geral
terceirizados – limpeza ou telemarketing[1]
- e a maioria dxs TRANS* condenadxs à prostituição como única forma de
sobrevivência[2].
Os ataques desde o
governo, que se diz laico, mas segue com suas inescrupulosas alianças com a
Igreja e setores conservadores, interferindo nas vidas e decisões pessoais
principalmente das mulheres e LGBTTI; que cedeu 118 milhões para a vinda do
Papa, e segue com acordos como o feito por Lula - Brasil-Vaticano, em 2008 -
são inúmeros. Seu clímax foi a suspensão ao Kit Escola sem Homofobia que, mesmo
com questionável qualidade, possibilitava pela primeira vez na história do
Brasil materiais de fácil acesso e uso que problematizavam diversidade sexual e
de gênero para as escolas. Outro exemplo do descaso do governo petista foi o
silêncio frente à tentativa de aprovação do projeto da “Cura Gay”, exercendo um
retrocesso de 22 anos, quando ainda se tinha o termo homossexualismo[3],
relacionando a sexualidade homoafetiva com uma patologia, doença, e assim
passível de cura pelxs psicólogxs – o que contraria os pareceres da maior
representação dessa classe no Brasil, o Conselho Federal de Psicologia. Soma-se
a este atentado aos Direitos Humanos o Estatuto do Nascituro (conhecido como “Bolsa
Estupro”), projeto reacionário que institucionaliza a legitimação do estupro
corretivo, uma vez que as mulheres não podem decidir sobre seu próprio corpo.
Este ano, assistimos cenas bizarras do governo russo de repressão aos/ LGBTTI. Trata-se
de uma expressão dos retrocessos do stalinismo no primeiro país a igualar
perante o Estado heterossexuais e LGBTTI (1918); estes são aprofundados pela
restauração capitalista ocorrida na Rússia. As leis “contra a propaganda”
(leia-se contra o ativismo por igualdade) homossexual assim como os casos de
tortura, assassinatos e opressão promovido por grupos de extrema direita são
expressões de um governo de um ex-membro da KGB, órgão de espionagem que foi
deixado pelo GPU, stalinista.
Os exemplos da luta LGBTTI e suas contradições.
A década de 60 foi um boom na luta dos setores oprimidos.
Mulheres, Negrxs e LGBTTI se organizavam, com diversos grupos, coletivos e
partidos políticos na luta por sua emancipação. Alguns com estratégias
reformistas, outros anticapitalistas, mas todxs partem da mesma realidade
internacional: acirramento da luta de classes e grandes aberturas revolucionárias.
Desde a revolução de 1917, na Rússia, se abrira ideologicamente, mas
também devido a decadência do próprio capitalismo, condições reais para uma
revolução socialista internacional, dirigida pelxs trabalhadorxs.
Marcado nesse contexto de efervescência
ideológica e acirramento das contradições de classe, surgi a Revolta de Stonewall,
marcada pela ação radicalizada dos setores LGBTTI não organizados, que não
abaixaram a cabeça para a repressão policial cotidiana em um bar de Nova York.
Essxs lutadorxs levantaram-se e demonstraram a força e rebeldia que carregam.
Foi a faísca que possibilitou a construção de diversos movimento pela liberdade
sexual e de gênero e pela luta por direitos igualitários. Na França, anos
depois, se consolidaria o FHAR (Frente Homossexual de Ação Revolucionária), que
apontaria a necessidade da luta LGBTTI ser encarada a partir da luta de classes
e da necessidade de uma aliança com xs trabalhadorxs para a emancipação de toda
a humanidade.
Mesmo com algumas conquistas em determinados
países, a democracia burguesa demonstrou que as leis e os direitos conquistados
em anos de luta não são perenes. Muito pelo contrário, se mantém a medida que o
Estado capitalista é capaz de sustentá-los e há motivos reais para
conservá-los. Não é surpresa que, em meio a crise mundial que vivemos, os
primeiros direitos a serem retirados sejam os dos setores oprimidos[4].
O movimento LGBTTI brasileiro, uma grande
referência mundial, não está respondendo mais às bandeiras históricas dxs
LGBTTI. A sua maior representação, a ABGLT, com mais de 270 ONGs filiadas,
tornou-se uma instituição de gestão de migalhas do governo de Frente Popular.
Não mobiliza mais as suas bases, exceto para eventos pontuais, como as Paradas
do Orgulho LGBT. Estes eventos, por sua vez, perderam o seu potencial
revolucionário frente a sua constante mercantilização, orquestrada pela
burguesia do Pink Money. Futuramente, poderá avaliar-se qual o grau de
contribuição da ABGLT para a manutenção da alienação da comunidade LGBTTI.
Assim, é necessária uma estratégia que supere
os limites da democracia burguesa e do sistema capitalista, avançando na
organização dxs LGBTTI juntxs com xs trabalhadorxs. Assim destruiremos
paulatinamente este Estado, extinguindo as classes sociais e os pilares das
opressões, construindo assim uma nova sociedade, livre de opressão e de toda
forma de exploração.
Por movimento pela livre sexualidade e construção da
identidade de gênero ligado à LUTA DE CLASSES!
É emergente
refletirmos sobre qual estratégia pode levar a nossa emancipação, lançando a
seguinte questão: qual organização xs LGBTTI necessitam para lutar?
É importante que o
movimento LGBTTI se reorganize a nível nacional e internacional, a partir de
uma compreensão por dentro da luta de classes. Em uma perspectiva de
organização que vá contra a ideologia consolidada em anos de neoliberalismo, de
que se deve lutar ou de forma autônoma - com grupos fragmentados, cada grupo
pelas suas necessidades - ou de maneira individual, por vias legais e
burocráticas. Em alternativa à institucionalização vivenciada pelo movimento
LGBTTI brasileiro, é preciso retomar uma reorganização desde a base ligada a
movimentos de bairro, comitês de trabalhadorxs, estudantes, organizações de
esquerda, sindicatos e entidades estudantis para que nossas bandeiras sejam
levantadas pelas mãos do conjunto da classe trabalhadora.
Partindo de que a
LGBTfobia é uma forma mais elaborada de controle de nossos corpos e mentes,
ligado à dominação de classe, não podemos simplesmente lutar por inclusão num sistema
estruturado de maneira heteronormativa e cisnormativa - onde os LGBTTI são
“anormalidades”).
É preponderante
que sejamos linha de frente pela construção de um Movimento Pela Livre
Sexualidade e Construção de Identidade de Gênero, que lutemos desde o direito a
adoção aos casais homoafetivos, a despatologização dxs TRANS* e o acesso à Saúde,
Educação, Trabalho e Moradia de qualidade, sem discriminação. Ligado à luta
anticapitalista, para que possamos avançar juntxs em nossa emancipação real.
Por isso, queremos neste encontro de Trabalhadorxs, Estudantes, Mulheres, Negrxs
e LGBTTI ser parte ativa na construção de uma aliança operário-estudantil e
também ligada aos setores oprimidos para que façamos emergir uma força que faça
a burguesia tremer! Retomarmos os exemplos do grupo SOMOS[5]
no Brasil, que se direcionou ao Estádio na Vila Euclides para saudar as greves
operárias do ABC para organizarmos Stonewall desde as ruas, nas universidades,
nas escolas e nos locais de trabalho contra toda a forma de opressão que
sofremos.
Para
nós, a luta LGBTTI é linha de frente para nossa emancipação sexual e de nossa
identidade de gênero. A Revolução é uma condição para que realmente sejamos
livres para decidirmos sobre nossos corpos e mentes. Desse modo, almejamos
construir um movimento em que estejam
lado a lado homossexuais e heterossexuais, homens e mulheres cis junto de
travestis, transexuais, homens-trans e intersex e todxs mais. Só assim
poderemos lutar pela liberdade sexual e de identidade de gênero! Pois em um mundo
tão tolido de liberdades e tão limitado de potencialidades, não a quem
pudesse alcançar tal liberdade!
AS BI, AS GAY, AS TRAVA E AS
SAPATÃO
TÃO TUDO ORGANIZADA PRA FAZER REVOLUÇÃO!
[1] É
interessante a localização de sujeitos LGBTTI que não se encaixam na estética e
comportamentos “heterossexuais” em nichos de mercado, especialmente no
telemarketing – onde x atendente é objetificadx em sua voz – ou em áreas mais
ligadas ao estereótipo feminino – como moda, higiene e vestuário e outros
setores considerados extensões do ambiente doméstico. Essa concentração dxs
LGBTTI soma-se a diversas opressões, relacionadas à heteronormatividade,
cissexismo e machismo, moldando condições de trabalho que são precárias e
exploradoras, tendo na ausência de amparo dessxs trabalhador pelas legislações
trabalhistas vigentes o seu principal marco.
[2]
Travestis e transexuais são as pessoas que mais sofrem com a marginalização de
suas identidades de gênero. Segundo o Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania
LGBT da UFMG (2013), 90 % dxs travestis e transexuais residentes em Belo Horizonte,
capital de Minas Gerais, já passaram pela prostituição ou nela ainda estão para
poderem pagar suas contas.
[3]
Até 1979, a
Organização Mundial de Saúde considerava a lesbianidade/homossexualidade como
transtornos psíquicos e comportamentais, e eram codificadas como doenças. Fruto
da pressão do movimento LGBTTI norte-americano e europeu, que tem como marco a
Revolta de Stonewall, xs conselheirxs da OMS retiraram o CID – Códico
Internacional de Doenças – relacionada à homoafetividade/homoerotismo,
legitimando a alcunha “homossexualidade” – sem o sufixo “ismo”, relacionado à
doença.
[4]
Frente à crise econômica de 2008 e seus impactos na economia brasileira, em
2011 o governo petista cortou 300 milhões de reais do orçamento destinado ao
combate ao machismo e homofobia, centralizados na Secretaria Nacional de
Direitos Humanos da Presidência da República.
[5]
Fundado em maio de 1978, o SOMOS – Grupo de Afirmação Homossexual foi a
primeira organização LGBTTI do Brasil, marcando a primeira onda desse movimento
no país. Composto inicialmente por mais de 20 pessoas, dentre sociais
democratas até trostkistas, surgiram em resposta aos impactos de Stonewall e a
efervescência político-sindical brasileira, que teve seu auge nos anos 80. Em
1979, no Dia dx Trabalhador, organizações sindicais do ABC paulista organizaram
um grande ato no Estádio na Vila Euclides, com mais de 80 mil pessoas. Metade
do SOMOS, composto por trabalhadorxs que estavam envolvidos nesse Ascenso sindical,
propôs fazer uma intervenção nesse importante ato, o que foi rechaçada pela
outra metade, por conta do medo da homofobia dxs trabalhadorxs presentes.
Enquanto uma metade foi fazer piquinique, a outra partiu para o estádio, com
faixas e dizeres que denunciavam a homofobia na sociedade e a solidariedade com
a luta dxs trabalhadorxs. A resposta dxs presentes foi uma salva de palmas que
emociona até hoje xs lutadorxs que vivenciaram essa importante aliança.
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