Por Thaís de Souza Lapa, co-autora do livro “Aborto e Religião nos tribunais brasileiros” e integrante do Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher- CLADEM.
Como os setores conservadores, ligados em sua maioria à instituições religiosas, tem encarado o aborto? A argumentação recorrente é a defesa da vida do feto. Em relação à condição indesejada da gravidez, tenta-se convencer a mulher de que seu papel natural é ser mãe, em paralelo à condenação dos métodos contraceptivos, exceto os naturais (coito interrompido, “tabelinha”), e a defesa do sexo exclusivamente dentro do casamento. Neste contexto, impedir uma gravidez entraria em conflito direto com o papel de mãe atribuído à mulher e com a finalidade reprodutiva atribuída ao sexo. E os anseios da mulher? São considerados equívocos a serem reparados.
A mobilização destes setores conservadores exemplifica-se em um caso emblemático: o de uma jovem de dezoito anos do Rio de Janeiro, grávida, que pediu autorização judicial para realização aborto de feto anencéfalo. O pedido a princípio foi negado, por não estar previsto em lei, mas em recurso julgado no tribunal estadual, foi concedido. Dois desembargadores aposentados, ao tomarem conhecimento da autorização, contestaram-na, porém sem efeito. Antes deles, um padre já havia impetrado um habeas corpus em favor da vida do feto, o que levou o caso ao Superior Tribunal de Justiça, onde a autorização antes concedida foi revertida, proibindo o aborto. Diante disto, duas ONGs feministas contestaram a decisão do STJ, reivindicando a autorização do aborto, mas, antes que esta ação fosse julgada, o feto nasceu.
Absurdo? Sim. Solução? A legalização do aborto. Previniria a mulher de tal sofrimento em vão. Seria um dos passos na efetiva escolha sobre sua sexualidade e reprodução, aliado à educação sexual, acesso à informação e a medicamentos contraceptivos no intuito de prevenir a gravidez indesejada, bem como o oferecimento do aborto legal na rede pública de saúde com qualidade.
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