A crise pesará duplamente sobre nossas costas
Por Clarissa Lemos e Diana Assunção
“A crise social, com seu cortejode calamidades, gravita com maiorpeso sobre as mulheres trabalhadoras”Leon Trotsky
A noção mais exata dos progressos de uma sociedade é dada pelas medidas práticas que são tomadas para melhorar a vida das mulheres. Hoje, é evidente que há pouca preocupação em torno disso já que as mulheres compõem cerca de 70% da população pobre; são a maioria entre os trabalhadores desempregados e continuam ganhando cerca de 30% a menos do que os homens. Também se intensifica o trabalho doméstico e as poucas creches públicas carecem de vagas. Sem falar da dupla-jornada das mulheres: o trabalho fora da casa (precarizado e mal remunerado), o cuidado da casa, limpeza, alimentação, higiene, sua e de sua família.
Além disso, quando uma mulher é pega de surpresa com uma gravidez, muitas vezes não quer nem pensar em ter esse filho, pois o sustento da casa depende dela e se o patrão descobre é provável que seja demitida. Não há alternativa senão fazer um aborto precário, pois aborto nos serviços de saúde pública não é disponível, além de ser crime e correr o risco de ser perseguida pela justiça, como a perseguição à quase 10 mil mulheres no Mato Grosso do Sul. Outras vezes as mulheres são pegas de surpresa quando a polícia mata seus filhos, como acontece freqüentemente no Rio e em Salvador, sem que nenhum culpado seja punido. Quando vai fazer um parto no hospital público seu bebê morre por falta de condições mínimas de atendimento, como aconteceu em Belém, no Pará, com quase 300 mortes de bebês somente no 1º semestre deste ano. Também vemos nosso salário diminuir frente aos preços dos alimentos, o transporte ficar mais caro, a educação piorar e as filas dos hospitais aumentarem. Isso tudo acontece em pleno século XXI e se chama capitalismo.
No Brasil o presidente Lula tem se apropriado de algumas demandas das mulheres, nos utilizando em seu discurso e também em sua política de maquiagem dessa inevitável miséria social do capitalismo. Criou uma secretaria especial de política para mulheres, sancionou a licença de maternidade opcional para 6 meses [1], está promovendo a figura de Dilma Roussef como futura presidenciável e o Ministério da Saúde está fazendo uma campanha em defesa do parto normal [2]. Vale ressaltar que a ampla maioria dos titulares do Bolsa Família são mulheres e é através de programas assistencialistas que Lula mantém importante base de apoio do seu governo.
Mas se não houve muitas melhoras nas condições de vida e trabalho quando o país crescia, agora menos ainda. É preciso nos preparar para enfrentar a crise internacional que já abala as principais economias do mundo e está chegando ao Brasil. Pois quem “paga o pato” é a classe trabalhadora através de demissões, desemprego, férias coletivas forçadas, rebaixamento salarial e intensificação da precarização, fome, repressão, mais miséria e mortes. E dizemos que as mulheres trabalhadoras sentirão duplamente essa carga pois vivem nas piores condições de submissão, cotidianamente humilhadas por esse sistema que lhes relega a escravidão doméstica, as tarefas mais pesadas, as dores mais cruéis.
E Lula continua com sua demagogia porque para ele “o papel do presidente é passar pra sociedade a serenidade que a sociedade precisa pra continuar acreditando no país”. Mas essa “serenidade” de Lula, só serve pra uma coisa: pra que acreditemos no capitalismo e na sua recuperação enquanto eles planejam como descarregar a crise sobre nossas costas. Ao contrário, devemos acreditar na força da classe trabalhadora, e confiar, como a história já comprovou diversas vezes, que são nesses momentos de crises sociais, econômicas e políticas que se despertam as melhores qualidades das mulheres, como a paixão, o heroísmo e a abnegação, sobretudo daquelas que são mais oprimidas, como as trabalhadoras. É preciso nos organizar desde já, pois não há dúvidas de que estaremos na linha de frente das lutas para enfrentar a crise capitalista!
Notas
[1] Que precisa da adesão das empresas para que se dê e, portanto, não atinge a maioria das mulheres. Leia mais.
[2] O parto normal traz menos riscos para as mulheres. Já o parto cesáreo além de trazer mais riscos de infecções e de vida para as mulheres, é amplamente propagado por ser grande fonte de lucros dos hospitais privados. Entretanto, o governo nada perde com essa campanha, já que é mais barato um parto normal do que cesáreo, diminuindo mais ainda seus gastos com a saúde.
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