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quarta-feira, 20 de abril de 2011

A insurreição das mulheres invisíveis

por Luciana Machado, estudante de Letras da USP,
militante do Pão e Rosas e da LER-QI

Greve: substantivo feminino. Hoje, na USP, de sujeito feminino. Sim, a greve tem rosto de mulher, negro, mulher negra. O apoio, aliança revolucionária, vem da jovem e do jovem, e eles são brancos. Essa brancura do estudante sabemos daonde vem: do vestibular, que é o meio que faz a universidade elitista e racista. E o preto daqueles? Vem da opressão, à mulher e ao preto, e à preta. Capitalismo funciona assim: lucro, dinheiro, trabalho, vida roubados: da mulher e do preto em dobro!

Na USP e no Brasil, trabalho precário, vida precária.

Dilma e Lula que vão à merda! Alckmin, Serra e Rodas também! A “mulher” e o “operário” fazem a máquina verde-amarela girar com o vermelho do sangue DAQUELAS mulheres e DAQUELES operários precarizados. E a “USP de excelência” também roda(s) assim. À merda!, que é cheiro da verdadeira sujeira pela qual são responsáveis: a semiescravidão.

Mas toda escravidão tem seus escravos insurrectos! As escravas insurrectas da USP estão dando seu recado: “Ô estudante, eu limpo o chão, mas eu sou contra a escravidão!”. Estudante ouviu. Apoiou. Foi pra reitoria. Contribuiu pro fundo de greve. Paralisou as aulas.
As mulheres choraram quando não receberam pelo trabalho feito. Não se mata a fome dormindo. A criança não consegue dormir, e a mãe também não.

Voltava do trabalho e tinha que cuidar dela; duas, três jornadas de trabalho no mesmo dia. No trabalho, humilhação, assédio moral, assédio sexual, saúde estragada – ou até a morte – porque não tem uma luva, um equipamento descente, nada! Tem que comer em 5 minutos e dentro do banheiro. Não pode conversar com ninguém, nem com o estudante e o professor que passam, nem com a colega do lado; não pode ser um ser humano, apenas uma máquina de varrer (e máquina não fica doente, só quebra; e quando quebra, trocam por outra). Chega em casa depois de 1 hora de caminhada – com que dinheiro dá pra pagar três reais, ainda mais sem vale-transporte? – e vai fazer a comida e limpar mais. Às 4 da manhã acorda de novo; no caminho pela madrugada, é estuprada. Mas não importa, dane-se – diz o patrão –; tem que limpar.

No primeiro de abril – infelizmente não era mentira –, as mulheres choraram quando não receberam pelo trabalho feito. Não se mata a fome dormindo.

BASTA DE ESCRAVIDÃO! – então ecoou. A experiência da greve de 2005 e o livrinho (“A Precarização tem Rosto de Mulher”) trouxe o vermelho de novo. O choro transparente da mulher invisível virou sangue pulsando nas veias, de ódio de classe!

“Já que acabou a escravidão, tem que acabar a terceirização”, disse uma trabalhadora.

“Estamos lutando pelo que é nosso por direito, não só o salário, mas por uma vida digna”, disse outra.

“Vou exigir da reitoria da USP porque trabalho na USP”, ainda mais uma. 

“Ninguém tá aqui pedindo esmola, estamos aqui lutando pra receber o que é nosso por direito, porque nós trabalhamos, nós ralamos”; “Todos dizem que não existem mais escravos, mas nós estamos representando os escravos do Brasil, porque os terceirizados são os escravos”, e mais uma.

Em coro em frente à reitoria, recado claro pro REItor, vindo das vísceras das trabalhadoras e de membros do Sintusp: “Trabalhador unido jamais será vencido!”; “ô reitoria, vê se escuta, uma só classe, uma só luta!”. Com a palavra e a vez, as terceirizadas e terceirizados da USP.

A fome se transformou em choro; o choro se transformou em grito; o grito, em união entre as trabalhadoras e trabalhadores; a união, em democracia operária; a democracia, em guerra tenaz de classe contra classe!

E então, o cheiro podre do lixo pelos corredores delatou a reitoria e o governo. Sujeira é deixar trabalhador sem ter o que comer e como morar! Sujeira é fazer a “excelência acadêmica” funcionar sustentada pela semiescravidão! “Será que depois de 8 anos trabalhando na USP não tenho direito de ser trabalhadora da USP?” Te soou estranha a pergunta? Pois é... hoje tem gente que trabalha na USP que não tem os mesmos direitos, aqueles conquistados com muita luta pelos efetivos.

A reitoria e a burguesia jogam um pano azul-marinho em cima das e dos terceirizados para que se tornem invisíveis aos olhos do estudante e do professor: o trabalho delas é serviço “meio”, desimportante... Será? O cheiro putrefato da universidade escravista prova que o trabalho da limpeza é fundamental. Fundamental para manter os corredores e salas de aula limpos, sim, mas pra limpar a direção da universidade, recolhendo e jogando fora os escravistas e privatistas da USP!

São trabalhadoras da USP, SIM! Queremos elas ao nosso lado imediatamente, sem o manto da invisibilidade e sem salário de fome, como trabalhadoras efetivas da universidade! E sem provinha escrita, porque já realizam a maior das provas todos os dias, tudo limpinho e brilhando!

Guerreiras, é isso que são. Sua luta é exemplo de mulheres e negros, contra a superexploração de seus corpos e vidas, e contra o lixo ideológico jogado ao vento pela burguesia, que divide os trabalhadores em categorias e subcategorias, para poder sugar o lucro obtido com mais suor e mais sangue.

É exemplo pra toda a classe! Que a insurreição das mulheres invisíveis, que agora se fazem temidas pelos inimigos de classe e respeitadas por estudantes e professores, ecoe por todos os cantos do país e do mundo!

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