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segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Diante da Gripe A:

Exigimos nosso direito à maternidade e à vida, e saúde para todos!
Por Milena Bagetti, Bruna Bastos e Clarissa Menezes
A gripe A (H1N1) que já se espalhou por todo o globo está atingindo com maior letalidade as crianças, idosos e mulheres grávidas em função de o sistema imunológico ser mais frágil. Mas não é somente esse o grupo de risco que é atingido, a população mais pobre do Brasil já sofre e morre diariamente em conseqüência de doenças causadas pelas péssimas condições de moradia e saneamento, alimentação e nutrição, e com essa pandemia, é atingida fortemente.
No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, das 192 mortes registradas pela doença no país até 8 de agosto, 28 eram de gestantes (14,5%). De todos os casos confirmados de gripe H1N1 no país, 8,5% são gestantes.
A gravidez não é doença, que isso esteja claro. Acontece que nós mulheres ao engravidar nosso organismo se adapta para nos manter e ao feto. Temos então o bombeamento de 30 a 50% a mais de sangue para o coração, respiramos mais rápida e profundamente para obter mais oxigênio. ficamos mais vulneráveis às doenças que atacam o sistema respiratório, pois como nosso útero aumenta, ele pressiona os pulmões reduzindo sua capacidade, fazendo com que, no caso de infecção pelo vírus da gripe A, nosso sistema respiratório fique ainda mais comprometido. Além disso, uma alimentação saudável com todos os nutrientes necessários é imprescindível para o fortalecimento do sistema imunológico. No entanto, milhões de mulheres brasileiras pobres não obtêm acesso a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente, ficando ainda mais suscetíveis às diversas enfermidades, entre elas a gripe A.
No Sistema Único de Saúde (SUS), diante dessa pandemia, os e as profissionais da saúde sequer têm acesso aos insumos necessários para sua proteção, como máscaras “bico de pato” e materiais para higiene. Além disso, o tratamento para gripe A requer o uso dos medicamentos que são comprados por custos altíssimos de empresas multinacionais ávidas por lucro e estão sendo insuficientes para o tratamento em muitos locais. Enquanto o governo federal afirma que o país está preparado para enfrentar a pandemia, as filas nos hospitais revelam uma realidade desesperadora. Além de muitas horas de espera, em grande parte dos casos de suspeita da gripe A, o paciente não tem acesso ao teste, já que a orientação do governo é restringir o teste aos casos de maior gravidade. Dessa forma, o vírus se espalha ainda mais e os pacientes não são tratados a tempo. Reivindicamos que sejam produzidos medicamentos genéricos, para baratear o tratamento da gripe A e que os governos distribuam toda medicação necessária nos hospitais públicos e todos os estabelecimentos de saúde com profissional qualificado para diagnóstico e prescrição.
Hoje, enquanto poucos governos postergam o início das atividades de creches, escolas e universidades, os/as trabalhadores/as destes locais não são todos dispensados, mostrando que para as empresas e governos, a vida dos trabalhadores vale menos. Em milhares de locais de trabalho as trabalhadoras grávidas seguem exercendo seu trabalho apesar dos altos índices de mortalidade. Sem contar as grandes fábricas, empresas de telemarketing, supermercados, entre outros, que continuam com a produção e o trabalho a todo vapor em ambientes fechados, com um conglomerado de mulheres e homens, com quase nenhuma circulação de ar, nenhum tipo de higienização periódica, em locais como estes o mesmo objeto passa na mão de dezenas ou centenas de pessoas (sejam peças, dinheiro), caracterizando assim um ambiente propício para a proliferação da doença.
O nosso direito à maternidade é negado cotidianamente, pois as trabalhadoras e o povo são diariamente colocados em situações e condições de risco, passando por privações alimentares, morando em locais sem condições de saneamento, sem água potável, sem emprego, ou com trabalhos precários, sem acesso a uma saúde pública e de qualidade que atenda às suas necessidades, e esse conjunto de fatores influencia diretamente em sua condição de saúde.
O caos na saúde pública em nosso país há anos se arrasta, enquanto isso presenciamos uma explosão de denúncias de corrupção no Senado, e em governos estaduais como o do Rio Grande do Sul. Todo dia temos notícias de mais esquemas de corrupção e o arquivamento descarado dos processos (quando são abertos). O dinheiro público que deveria ser destinado às demandas da população, em saúde, educação, moradia, acaba alimentando a farra nas instituições políticas brasileiras enquanto outra parte é destinada ao pagamento de dívidas que não criamos. Passamos por um momento histórico em que o neoliberalismo aguçou todo individualismo, mas não podemos nos deixar contaminar, por isso devemos nos colocar em pé de luta, para juntas lutar e conquistar nossos direitos!
Por isso, diante da gripe A, em defesa da vida das trabalhadoras grávidas, exigimos afastamento de todas trabalhadoras, efetivas e terceirizadas, sem nenhum desconto salarial e de benefícios! Assistência mais intensa ao pré-natal. Mais verbas para a Saúde Pública! Contratação de profissionais da saúde efetivos, médicos, enfermeiros, farmacêuticos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, dentistas, entre outros profissionais da saúde! Garantia de alimentação, orientação e medicação necessária às mulheres trabalhadoras das periferias, trabalhadoras domésticas, donas de casa, a todas trabalhadoras informais e desempregadas! Vacina para todas e todos já! Distribuição de antivirais em todos os postos de saúde e hospitais públicos, em base à quebra da patente e distribuição gratuita para todas e todas que necessitem! Abertura gratuita à população das clínicas e hospitais privados imediatamente! Mais nenhuma morte por Gripe A!

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Depoimentos sobre a gripe A e a saúde pública

“Por mais comida e menos Tamiflu.
Em tempos de gripe A (inicialmente chamada de gripe suína) faz-se necessária uma reflexão sobre qual modelo de sistema de saúde queremos. Nos postos de saúde, na rede de atenção primária, nos hospitais referência ao atendimento de moléstias infecciosas, o que se observa é o mesmo cotidiano caótico de sempre. O alarde da mídia não foi acompanhado de capacitação dos recursos humanos na área da saúde, muito menos de uma reorganização na assistência capaz de conter a crescente demanda de uma população que se desespera com o passar dos dias. Quem dita realmente as prioridades na assistência à saúde? A necessidade? A mídia? O que se observa na prática, é que se existisse uma estrutura de atendimento satisfatória para doenças do “terceiro mundo” (diarréia, pneumonias, desnutrição...), não precisaríamos de todo esse dispêndio de recursos para conter uma epidemia obscura, com dados conflitantes e de magnitude controversa. Enquanto isso, crianças continuam a morrer de fome, mulheres de complicações relacionadas a abortos clandestinos, nos prontos-socorros faltam gaze e soro. (...)”
Eduardo Falcão, estudante 6º ano de medicina- Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas e estagiário do Programa de Saúde da Família Virgem dos Pobres, Maceió-AL.

“Fomos pegos meio no susto, um dia era algo localizado no México, depois algo terrível que na era do avião poderia matar mais que a gripe espanhola que matou mais de 50 milhões de pessoas, o susto vai aumentando de acordo com cada novo alerta da OMS. Começam a chegar normas diárias, cuidados com os viajantes, cuidados com os vizinhos... e de repente o vírus se espalha de uma maneira não autorizada por pessoas que achavam que com panfletos e normas iam ajudar a explicar ao vírus como ele devia se comportar... Devemos nos preparar, devemos triar e prevenir, decidir a quem dar um remédio que a CONVISA confiscou... Mas é igual ao vírus que sempre vimos, como diferenciar??? Fomos pegos de surpresa, nos preparamos a cada dia com a nova norma que sai a cada minuto. Mas, como me preocupar tanto com uma doença, quando vejo milhares de pessoas ainda morrendo de catapora, malária, gravidez de risco ...”
Raquel, médica do PSF da zona sul na periferia de São Paulo

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